O cenário pensado e produzido em conjunto com a estilista Fernanda Yamamoto para o seu desfile no SPFW (São Paulo Fashion Week) Inverno 2016 se revela como um ponto de encontro entre cultura e tradição com expressões contemporâneas da Moda e da Arquitetura. Acima de tudo, a proposta para esta construção efêmera buscou dialogar com a coleção apresentada pela estilista e pautada por técnicas e linguagens onde a composição fragmentos, partes e elementos alcançam efeitos de enorme expressividade, ainda mais potencializados quando aliados à luz.

Junto a isso, é imediata a referência ao contexto dos lugares onde a produção dessa cultura, conduzida quase unanimemente por mulheres, se dá. Incursões à região do Cariri no estado brasileiro da Paraíba, fez com que os autores, encantados pela descoberta de um cenário real, autenticamente brasileiro em todos os seus sentidos sociais, políticos, econômicos e culturais, buscassem traduzir de modo simples a beleza dessas condições num cenário efêmero.

As paisagens das pequenas cidades, das propriedades rurais, da arquitetura das casas, dos lares das rendeiras, revelam uma poesia sem igual contida não apenas na matéria de suas paredes, mas principalmente, no cotidiano daquelas que as constroem. O ambiente vernacular de cada um deles, como nas rendas, originam aqui matérias têxteis e construtivas pelas quais também possamos ver através.

Abaixo, texto da coleção Inverno 2016:

Sobre ‘Histórias Rendadas’
(Fernanda Yamamoto) 

Mais de 180 quilômetros separam a capital paraibana João Pessoa da região do Cariri, no sul do estado, na qual a caatinga semi-árida domina a paisagem dos 29 municípios, com respiros que aparecem nas pequenas casas de alvenaria aqui e acolá. Nesse ambiente predominante seco, de alta incidência solar, uma cena se repete com frequência: antes e após o almoço, algumas mulheres separam sua almofada, suas agulhas, suas linhas brancas e sua paciência, se acomodam em frente à porta de suas respectivas casas e desandam a fazer um dos trabalhos artesanais mais reconhecidos da região: a renda renascença. Estritamente manual, a renda vai sendo desenhada aos poucos, num exercício que demanda tempo, precisão e carinho. Não à toa é uma tradição, reproduzida há décadas por famílias inteiras, que se especializaram na arte de criar floreios e outros padrões com as linhas. Inspirada pelas sete viagens realizadas à região, a designer Fernanda Yamamoto retoma essa tradição de maneira repaginada para a coleção Inverno 2016. No lugar das clássicas flores da renda renascença, ela imprimiu toques autorais e desenvolveu, em parceria com 77 artesãs organizadas pelo coletivo feminista Cunhã, renda com padronagens geométricas, usando raízes, galhos, rachaduras, nuvens cercas e outras imagens que aparecem no rico e histórico sertão do Cariri como referência. Pensados por Fernanda, os pontos mais abertos geram leveza e fluidez a um tecido originalmente duro e com pouco movimento. À renda renascença de algodão foram somados couro, feltro (lã), jacquards exclusivos, feitos a partir de fotos tiradas ao longo do projeto, tricô e outros tecidos para dar vida à coleção que, na contramão das clássicas cores sóbrias invernais, traz na paleta tons pastel de rosa, azul e verde. Cores terrosas, cinzas e brancos foram usados para balancear as peças, que ressaltam a alma feminina e um trabalho artesanal preservado há gerações, que não se abala com o passar do tempo e nem perde a delicadeza frente ao ambiente árido no qual é feita.

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